Por Elo Clínica
A criopreservação propõe a paralisação biológica dos materiais coletados — movimentos moleculares, atividades das enzimas e reações químicas são suspensas quando os produtos biológicos são congelados.
No âmbito da reprodução assistida, a criopreservação de gametas, embriões e tecidos gonádicos é realizada como técnica complementar nos tratamentos de fertilização in vitro (FIV).
Apesar das baixíssimas temperaturas em que são mantidos, inferiores a 150° negativos, os materiais congelados têm suas atividades interrompidas, mas sua vitalidade é recuperada com o processo de descongelamento, sem danos celulares. Isso é possível em virtude do protocolo atual empregado na criopreservação.
O uso de crioprotetores — substâncias necessárias durante o congelamento — garante a proteção das células, uma vez que reduz a formação de cristais de gelo em seu interior e entrega maior estabilidade à membrana celular.
A técnica da criopreservação
A criopreservação pode ser realizada com dois métodos distintos. O congelamento lento é a forma clássica de realizar o procedimento e requer concentrações moderadas de crioprotetores. Nesse protocolo, as taxas de resfriamento promovem a substituição gradual da água intracelular por substâncias crioprotetoras, sem prejuízos à funcionalidade das células.
Por sua vez, a vitrificação é o método mais empregado nos tratamentos atuais e consiste no congelamento ultrarrápido, embora seja comprovadamente seguro para a preservação celular. Esse método demanda uma concentração maior de crioprotetores, e a temperatura aplicada chega a -196°.
Com a vitrificação, os gametas e embriões passam do estado líquido para o estado vítreo em minutos, e são mantidos em tanques de nitrogênio líquido até o dia em que serão utilizados em um ciclo de FIV.
É importante que a técnica promova um congelamento em ritmo suficiente para evitar a cristalização da água intracelular, mas que também seja rápido o bastante para prevenir a exposição das células a possíveis danos anteriores à criopreservação.
No processo de descongelamento, a quantidade de crioprotetores diminui à medida que a temperatura se eleva. Tanto a criopreservação quanto o descongelamento são processos complexos, tendo em vista que todo cuidado é necessário para que a vitalidade e a qualidade dos materiais biológicos não sofra alterações.
As indicações para o congelamento de gametas
A criopreservação de óvulos e espermatozoides é indicada em diferentes ocasiões. Quando o(a) paciente precisa iniciar um tratamento de câncer, é possível passar pela preservação oncológica da fertilidade.
Os fármacos utilizados em quimioterapia e radioterapia são agressivos ao organismo e podem prejudicar a produção dos hormônios envolvidos no processo reprodutivo. Assim, o congelamento de gametas é uma alternativa para ter filhos biológicos no futuro.
A indicação também vale para preservação social da fertilidade, comumente procurada por mulheres que querem postergar os planos de gravidez, por razões profissionais ou escolha pessoal. Sabe-se que a fertilidade feminina tende a diminuir com o avanço da idade.
A partir dos 35 anos, a reserva ovariana — quantidade de óvulos armazenados — apresenta redução significativa, assim como a qualidade dos gametas declina.
A criopreservação dos óvulos também tem sido indicada para pacientes que vão passar por cirurgias que possam afetar a função dos ovários, como a remoção de cistos ou tratamento de endometriose ovariana.
As indicações para o congelamento de embriões
Além de ser uma técnica complementar em casos específicos, a criopreservação ainda pode representar a sexta etapa dos processos de FIV. O Conselho Federal de Medicina (CFM) determina um número máximo de embriões a serem transferidos, de acordo com a idade da paciente. Assim, os embriões excedentes devem ser criopreservados, seja para tentativas futuras de concepção, seja para doação.
Também pode ocorrer de todos os embriões gerados em um mesmo ciclo serem congelados, técnica chamada freeze-all. Isso pode ser necessário quando a paciente apresenta síndrome da hiperestimulação ovariana (SHO) e necessita de tempo para se restabelecer.
Diante de falhas de implantação embrionária, o método freeze-all também pode ser indicado para que a paciente seja avaliada com o teste ERA, ou teste de receptividade endometrial — utilizado para determinar o período em que o útero está mais preparado para receber o embrião.
A criopreservação de embriões também é indicada nas situações descritas no tópico anterior — preservação da fertilidade devido a tratamento de doenças ou adiamento da gestação —, embora o congelamento de gametas seja mais realizado em tais casos.
A prática da criopreservação segundo as normas do CFM
Com a resolução 2168, o CFM instituiu as normas éticas que orientam as técnicas da reprodução assistida. A criopreservação de gametas e embriões é respaldada nas seguintes diretrizes:
- O número total de embriões gerados em laboratório será comunicado aos pacientes para que decidam quantos embriões serão transferidos a fresco, conforme determina a Resolução. Os excedentes, viáveis, devem ser criopreservados;
- No momento da criopreservação, os pacientes devem manifestar sua vontade, por escrito, quanto ao destino a ser dado aos embriões criopreservados em caso de divórcio ou dissolução de união estável, doenças graves ou falecimento de um deles ou de ambos, e quando desejam doá-los;
- Os embriões criopreservados com três anos ou mais poderão ser descartados se esta for a vontade expressa dos pacientes;
- Os embriões criopreservados e abandonados por três anos ou mais poderão ser descartados.
Como visto, a criopreservação é um recurso fundamental na reprodução assistida, uma vez que amplia as possibilidades de tratamento para casais em condições específicas. Vale acentuar que o uso dos gametas e embriões a fresco ou congelados não altera o percentual de sucesso da FIV, o fator determinante é a qualidade originária do material genético.